Enquanto escrevo
este artigo, continuam a chegar notícias e imagens da terrível tragédia
ocorrida em Santa Maria
(RS), na madrugada deste domingo, dia 27. Mais de 230 mortos confirmados no
incêndio da casa noturna. A maioria, jovens estudantes. Santa Maria é uma
cidade universitária, com estudantes de todo o Brasil. Muita consternação.
Sofrimento e
tristeza imensas abateram-se, de repente, sobre inúmeras famílias, que punham
tantas esperanças nos seus filhos jovens, cheios de vida e de ideais. A dor é
compartilhada pelo Brasil inteiro; de todos os lados, chegam mensagens de
solidariedade, de autoridades políticas, lideranças comunitárias e pessoas
comuns do povo: todos gostariam de se manifestar, de fazer algo, de dizer uma palavra
de conforto às mães desesperadas diante dos corpos estendidos no chão do
ginásio de esportes, para serem reconhecidos e identificados... À distância,
nos colocamos em oração silenciosa, a pedir a Deus o conforto pelos que sofrem
e a vida eterna para os que a perderam tão precoce e tragicamente para este
mundo.
Vida e morte se
encontraram numa circunstância inusitada, enquanto os jovens festejavam e se
alegravam... Da diversão ao luto, em poucos minutos! Como é possível que
aconteçam tragédias semelhantes? As responsabilidades ainda devem ser apuradas,
mas tomam sobre si enormes encargos pela segurança, a integridade física e a
vida de outras pessoas, aqueles que mantêm semelhantes locais de agregação de
massas humanas, sejam os fins que forem; as medidas emergenciais de segurança
estavam todas asseguradas e checadas? Espetáculos com elementos de risco
estavam autorizados? Os locais estavam devidamente vistoriados e liberados
pelas autoridades competentes? Estavam habilitados e treinados aqueles que deviam
zelar pela segurança?
Após a tragédia,
passado o silêncio respeitoso pelos mortos e aos muitos feridos e enlutados,
resta fazer uma reflexão em vários setores: quanto vale a vida humana? Ela pode
ser moeda de troca em função de ganhos e lucros? Cada vida humana é única e
preciosa, não podendo ser exposta ao perigo, de maneira leviana; mais ainda,
quando se pretendem maiores ganhos, com menores despesas em segurança. Semelhantes
tragédias, igualmente em casas noturnas de diversão, têm acontecido em outros
países também. Não estaria na hora de haver maior vigilância sobre a segurança
de tais locais?
Para o Brasil, o
motivo de tristeza ainda é maior, justamente neste ano, quando acontecerá a
Jornada Mundial da Juventude, em julho, no Rio de Janeiro. Há poucas semanas, a
cruz da Jornada da Juventude peregrinou por Santa Maria, com a acolhida e a
participação entusiasta de milhares de jovens. Talvez, muitos dos que perderam
a vida no incêndio estiveram também entre eles... E a juventude é tema da
Campanha da Fraternidade, que será aberta na próxima Quaresma: “Juventude e
Fraternidade”.
A tragédia de
Santa Maria nos motiva a voltarmos nossa atenção com maior empenho para os
jovens: que não lhes falte a presença, o estímulo e o bom exemplo dos adultos
nas escolhas que devem fazer para a vida; que tenham oportunidades para se
preparar bem para assumirem seu lugar na sociedade e seu rumo na vida; que não
sejam abandonados, de maneira resignada, aos ideólogos do vazio e da
desorientação antropológica e moral, ou aos que investem pesado neles para
explorar suas energias jovens e sua vontade de viver em função de manobras
ideológicas ou ganhos econômicos, conduzindo-os para os becos sem saída da
droga, da corrupção moral e social. Que não recebam apenas propostas vazias e
nihilistas para suas vidas, mas orientações e indicações sólidas para a
construção de seu futuro.
No Brasil, nós
temos neste ano uma chance de ouro para nos dirigirmos aos jovens. São eles que
terão nas mãos a responsabilidade pela vida social, logo mais, daqui a poucos
anos. E da vida da Igreja também. A Campanha da Fraternidade está às portas e a
Jornada Mundial da Juventude já está mobilizando muitas energias jovens pelo
Brasil todo. Como faremos para envolver a maioria absoluta dos jovens, que ainda
não são alcançados pelas nossas propostas pastorais, nem nossas homilias
dominicais, mas que se encontram, aos milhões, nas escolas e universidades e
nas casas de diversão, sábados à noite?
Publicado em O SÃO PAULO, ed. de 29.01.2013
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo
Nenhum comentário:
Postar um comentário