MENSAGEM
DIA MUNDIAL
DA PAZ
1º DE JANEIRO DE 2013
BEM-AVENTURADOS OS OBREIROS DA PAZ
1º DE JANEIRO DE 2013
BEM-AVENTURADOS OS OBREIROS DA PAZ
1. Cada ano novo traz consigo a expectativa de um
mundo melhor. Nesta perspectiva, peço a Deus, Pai da humanidade, que nos
conceda a concórdia e a paz a fim de que possam tornar-se realidade, para
todos, as aspirações duma vida feliz e próspera.
À distância de 50
anos do início do Concílio Vaticano II, que permitiu dar mais força à missão da
Igreja no mundo, anima constatar como os cristãos, Povo de Deus em comunhão com
Ele e caminhando entre os homens, se comprometem na história compartilhando alegrias
e esperanças, tristezas e angústias, anunciando a salvação de Cristo e
promovendo a paz para todos.
Na realidade o
nosso tempo, caracterizado pela globalização, com seus aspectos positivos e
negativos, e também por sangrentos conflitos ainda em curso e por ameaças de
guerra, requer um renovado e concorde empenho na busca do bem comum, do
desenvolvimento de todo o homem e do homem todo.
Causam apreensão
os focos de tensão e conflito causados por crescentes desigualdades entre ricos
e pobres, pelo predomínio duma mentalidade egoísta e individualista que se
exprime inclusivamente por um capitalismo financeiro desregrado. Além de
variadas formas de terrorismo e criminalidade internacional, põem em perigo a
paz aqueles fundamentalismos e fanatismos que distorcem a verdadeira natureza
da religião, chamada a favorecer a comunhão e a reconciliação entre os homens.
E no entanto as
inúmeras obras de paz, de que é rico o mundo, testemunham a vocação natural da
humanidade à paz. Em cada pessoa, o desejo de paz é uma aspiração essencial e
coincide, de certo modo, com o anelo por uma vida humana plena, feliz e bem
sucedida. Por outras palavras, o desejo de paz corresponde a um princípio moral
fundamental, ou seja, ao dever-direito de um desenvolvimento integral, social,
comunitário, e isto faz parte dos desígnios que Deus tem para o homem. Na
verdade, o homem é feito para a paz, que é dom de Deus.
Tudo isso me
sugeriu buscar inspiração, para esta Mensagem, às palavras de Jesus Cristo:
«Bem--aventurados os obreiros da paz, porque serão chamados filhos de Deus» (Mt
5, 9).
A
bem-aventurança evangélica
2. As bem-aventuranças proclamadas por Jesus (cf. Mt 5, 3-12; Lc 6, 20-23) são promessas. Com efeito, na tradição bíblica, a bem-aventurança é um género literário que traz sempre consigo uma boa nova, ou seja um evangelho, que culmina numa promessa. Assim, as bem-aventuranças não são meras recomendações morais, cuja observância prevê no tempo devido – um tempo localizado geralmente na outra vida – uma recompensa, ou seja, uma situação de felicidade futura; mas consistem sobretudo no cumprimento duma promessa feita a quantos se deixam guiar pelas exigências da verdade, da justiça e do amor. Frequentemente, aos olhos do mundo, aqueles que confiam em Deus e nas suas promessas aparecem como ingénuos ou fora da realidade; ao passo que Jesus lhes declara que já nesta vida – e não só na outra – se darão conta de serem filhos de Deus e que, desde o início e para sempre, Deus está totalmente solidário com eles. Compreenderão que não se encontram sozinhos, porque Deus está do lado daqueles que se comprometem com a verdade, a justiça e o amor. Jesus, revelação do amor do Pai, não hesita em oferecer-Se a Si mesmo em sacrifício. Quando se acolhe Jesus Cristo, Homem-Deus, vive-se a jubilosa experiência de um dom imenso: a participação na própria vida de Deus, isto é, a vida da graça, penhor duma vida plenamente feliz. De modo particular, Jesus Cristo dá-nos a paz verdadeira, que nasce do encontro confiante do homem com Deus.
A bem-aventurança
de Jesus diz que a paz é, simultaneamente, dom messiânico e obra humana. Na
verdade, a paz pressupõe um humanismo aberto à transcendência; é fruto do dom
recíproco, de um mútuo enriquecimento, graças ao dom que provém de Deus e nos
permite viver com os outros e para os outros. A ética da paz é uma ética de
comunhão e partilha. Por isso, é indispensável que as várias culturas de hoje
superem antropologias e éticas fundadas sobre motivos teorico-práticos
meramente subjectivistas e pragmáticos, em virtude dos quais as relações da
convivência se inspiram em critérios de poder ou de lucro, os meios tornam-se
fins, e vice-versa, a cultura e a educação concentram-se apenas nos
instrumentos, na técnica e na eficiência. Condição preliminar para a paz é o
desmantelamento da ditadura do relativismo e da apologia duma moral totalmente
autónoma, que impede o reconhecimento de quão imprescindível seja a lei moral
natural inscrita por Deus na consciência de cada homem. A paz é construção em
termos racionais e morais da convivência, fundando-a sobre um alicerce cuja
medida não é criada pelo homem, mas por Deus. Como lembra o Salmo 29, « o
Senhor dá força ao seu povo; o Senhor abençoará o seu povo com a paz » (v. 11).
A paz:
dom de Deus e obra do homem
3. A paz envolve o ser humano na sua integridade e supõe o empenhamento da pessoa inteira: é paz com Deus, vivendo conforme à sua vontade; é paz interior consigo mesmo, e paz exterior com o próximo e com toda a criação. Como escreveu o Beato João XXIII na Encíclica Pacem in terris – cujo cinquentenário terá lugar dentro de poucos meses –, a paz implica principalmente a construção duma convivência humana baseada na verdade, na liberdade, no amor e na justiça.A negação daquilo que constitui a verdadeira natureza do ser humano, nas suas dimensões essenciais, na sua capacidade intrínseca de conhecer a verdade e o bem e, em última análise, o próprio Deus, põe em perigo a construção da paz. Sem a verdade sobre o homem, inscrita pelo Criador no seu coração, a liberdade e o amor depreciam-se, a justiça perde a base para o seu exercício.
3. A paz envolve o ser humano na sua integridade e supõe o empenhamento da pessoa inteira: é paz com Deus, vivendo conforme à sua vontade; é paz interior consigo mesmo, e paz exterior com o próximo e com toda a criação. Como escreveu o Beato João XXIII na Encíclica Pacem in terris – cujo cinquentenário terá lugar dentro de poucos meses –, a paz implica principalmente a construção duma convivência humana baseada na verdade, na liberdade, no amor e na justiça.A negação daquilo que constitui a verdadeira natureza do ser humano, nas suas dimensões essenciais, na sua capacidade intrínseca de conhecer a verdade e o bem e, em última análise, o próprio Deus, põe em perigo a construção da paz. Sem a verdade sobre o homem, inscrita pelo Criador no seu coração, a liberdade e o amor depreciam-se, a justiça perde a base para o seu exercício.
Para nos
tornarmos autênticos obreiros da paz, são fundamentais a atenção à dimensão
transcendente e o diálogo constante com Deus, Pai misericordioso, pelo qual se
implora a redenção que nos foi conquistada pelo seu Filho Unigénito. Assim o
homem pode vencer aquele germe de obscurecimento e negação da paz que é o
pecado em todas as suas formas: egoísmo e violência, avidez e desejo de poder e
domínio, intolerância, ódio e estruturas injustas.
A realização da paz
depende sobretudo do reconhecimento de que somos, em Deus, uma única família
humana. Esta, como ensina a Encíclica Pacem in terris, está estruturada
mediante relações interpessoais e instituições sustentadas e animadas por um
«nós» comunitário, que implica uma ordem moral, interna e externa, na qual se
reconheçam sinceramente, com verdade e justiça, os próprios direitos e os
próprios deveres para com os demais. A paz é uma ordem de tal modo vivificada e
integrada pelo amor, que se sentem como próprias as necessidades e exigências
alheias, que se fazem os outros comparticipantes dos próprios bens e que se
estende sempre mais no mundo a comunhão dos valores espirituais. É uma ordem
realizada na liberdade, isto é, segundo o modo que corresponde à dignidade de
pessoas que, por sua própria natureza racional, assumem a responsabilidade do
próprio agir.
A paz não é um
sonho, nem uma utopia; a paz é possível. Os nossos olhos devem ver em
profundidade, sob a superfície das aparências e dos fenómenos, para vislumbrar
uma realidade positiva que existe nos corações, pois cada homem é criado à
imagem de Deus e chamado a crescer contribuindo para a edificação dum mundo
novo. Na realidade, através da encarnação do Filho e da redenção por Ele
operada, o próprio Deus entrou na história e fez surgir uma nova criação e uma
nova aliança entre Deus e o homem (cf. Jr 31, 31-34), oferecendo-nos a
possibilidade de ter « um coração novo e um espírito novo » (cf. Ez 36, 26).
Por isso mesmo, a
Igreja está convencida de que urge um novo anúncio de Jesus Cristo, primeiro e
principal factor do desenvolvimento integral dos povos e também da paz. Na
realidade, Jesus é a nossa paz, a nossa justiça, a nossa reconciliação (cf. Ef
2, 14; 2 Cor 5, 18). O obreiro da paz, segundo a bem--aventurança de Jesus, é
aquele que procura o bem do outro, o bem pleno da alma e do corpo, no tempo
presente e na eternidade.
A partir deste
ensinamento, pode-se deduzir que cada pessoa e cada comunidade – religiosa,
civil, educativa e cultural – é chamada a trabalhar pela paz. Esta consiste,
principalmente, na realização do bem comum das várias sociedades, primárias e
intermédias, nacionais, internacionais e a mundial. Por isso mesmo, pode-se
supor que os caminhos para a implementação do bem comum sejam também os caminhos
que temos de seguir para se obter a paz.
Obreiros
da paz são aqueles que amam,defendem e promovem a vida na sua integridade
4. Caminho para a consecução do bem comum e da paz é, antes de mais nada, o respeito pela vida humana, considerada na multiplicidade dos seus aspectos, a começar da concepção, passando pelo seu desenvolvimento até ao fim natural. Assim, os verdadeiros obreiros da paz são aqueles que amam, defendem e promovem a vida humana em todas as suas dimensões: pessoal, comunitária e transcendente. A vida em plenitude é o ápice da paz. Quem deseja a paz não pode tolerar atentados e crimes contra a vida.
4. Caminho para a consecução do bem comum e da paz é, antes de mais nada, o respeito pela vida humana, considerada na multiplicidade dos seus aspectos, a começar da concepção, passando pelo seu desenvolvimento até ao fim natural. Assim, os verdadeiros obreiros da paz são aqueles que amam, defendem e promovem a vida humana em todas as suas dimensões: pessoal, comunitária e transcendente. A vida em plenitude é o ápice da paz. Quem deseja a paz não pode tolerar atentados e crimes contra a vida.
Aqueles que não
apreciam suficientemente o valor da vida humana, chegando a defender, por
exemplo, a liberalização do aborto, talvez não se dêem conta de que assim estão
a propor a prossecução duma paz ilusória. A fuga das responsabilidades, que
deprecia a pessoa humana, e mais ainda o assassinato de um ser humano indefeso
e inocente nunca poderão gerar felicidade nem a paz. Na verdade, como se pode
pensar em realizar a paz, o desenvolvimento integral dos povos ou a própria
salvaguarda do ambiente, sem estar tutelado o direito à vida dos mais frágeis,
a começar pelos nascituros? Qualquer lesão à vida, de modo especial na sua
origem, provoca inevitavelmente danos irreparáveis ao desenvolvimento, à paz,
ao ambiente. Tão pouco é justo codificar ardilosamente falsos direitos ou
opções que, baseados numa visão redutiva e relativista do ser humano e com o
hábil recurso a expressões ambíguas tendentes a favorecer um suposto direito ao
aborto e à eutanásia, ameaçam o direito fundamental à vida.
Também a
estrutura natural do matrimónio, como união entre um homem e uma mulher, deve
ser reconhecida e promovida contra as tentativas de a tornar, juridicamente,
equivalente a formas radicalmente diversas de união que, na realidade, a
prejudicam e contribuem para a sua desestabilização, obscurecendo o seu
carácter peculiar e a sua insubstituível função social.
Estes princípios
não são verdades de fé, nem uma mera derivação do direito à liberdade
religiosa; mas estão inscritos na própria natureza humana – sendo reconhecíveis
pela razão – e consequentemente comuns a toda a humanidade. Por conseguinte, a
acção da Igreja para os promover não tem carácter confessional, mas dirige-se a
todas as pessoas, independentemente da sua filiação religiosa. Tal acção é
ainda mais necessária quando estes princípios são negados ou mal entendidos,
porque isso constitui uma ofensa contra a verdade da pessoa humana, uma ferida
grave infligida à justiça e à paz.
Por isso, uma
importante colaboração para a paz é dada também pelos ordenamentos jurídicos e
a administração da justiça quando reconhecem o direito ao uso do princípio da
objecção de consciência face a leis e medidas governamentais que atentem contra
a dignidade humana, como o aborto e a eutanásia.
Entre os direitos
humanos basilares mesmo para a vida pacífica dos povos, conta-se o direito dos
indivíduos e comunidades à liberdade religiosa. Neste momento histórico,
torna-se cada vez mais importante que este direito seja promovido não só
negativamente, como liberdade de – por exemplo, de obrigações e coacções quanto
à liberdade de escolher a própria religião –, mas também positivamente, nas
suas várias articulações, como liberdade para: por exemplo, para testemunhar a
própria religião, anunciar e comunicar a sua doutrina; para realizar
actividades educativas, de beneficência e de assistência que permitem aplicar
os preceitos religiosos; para existir e actuar como organismos sociais, estruturados
de acordo com os princípios doutrinais e as finalidades institucionais que lhe
são próprias. Infelizmente vão-se multiplicando, mesmo em países de antiga
tradição cristã, os episódios de intolerância religiosa, especialmente contra o
cristianismo e aqueles que se limitam a usar os sinais identificadores da
própria religião.
O obreiro da paz
deve ter presente também que as ideologias do liberalismo radical e da
tecnocracia insinuam, numa percentagem cada vez maior da opinião pública, a
convicção de que o crescimento económico se deve conseguir mesmo à custa da
erosão da função social do Estado e das redes de solidariedade da sociedade
civil, bem como dos direitos e deveres sociais. Ora, há que considerar que
estes direitos e deveres são fundamentais para a plena realização de outros, a
começar pelos direitos civis e políticos.
E, entre os
direitos e deveres sociais actualmente mais ameaçados, conta-se o direito ao
trabalho. Isto é devido ao facto, que se verifica cada vez mais, de o trabalho
e o justo reconhecimento do estatuto jurídico dos trabalhadores não serem
adequadamente valorizados, porque o crescimento económico dependeria sobretudo
da liberdade total dos mercados. Assim o trabalho é considerado uma variável
dependente dos mecanismos económicos e financeiros. A propósito disto, volto a
afirmar que não só a dignidade do homem mas também razões económicas, sociais e
políticas exigem que se continue « a perseguir como prioritário o objectivo do
acesso ao trabalho para todos, ou da sua manutenção ».4 Para se realizar este
ambicioso objectivo, é condição preliminar uma renovada apreciação do trabalho,
fundada em princípios éticos e valores espirituais, que revigore a sua
concepção como bem fundamental para a pessoa, a família, a sociedade. A um tal
bem corresponde um dever e um direito, que exigem novas e ousadas políticas de
trabalho para todos.
Construir
o bem da paz através de um novo modelo de desenvolvimento e de economia
5. De vários lados se reconhece que, hoje, é necessário um novo modelo de desenvolvimento e também uma nova visão da economia. Quer um desenvolvimento integral, solidário e sustentável, quer o bem comum exigem uma justa escala de bens-valores, que é possível estruturar tendo Deus como referência suprema. Não basta ter à nossa disposição muitos meios e muitas oportunidades de escolha, mesmo apreciáveis; é que tanto os inúmeros bens em função do desenvolvimento como as oportunidades de escolha devem ser empregues de acordo com a perspectiva duma vida boa, duma conduta recta, que reconheça o primado da dimensão espiritual e o apelo à realização do bem comum. Caso contrário, perdem a sua justa valência, acabando por erguer novos ídolos.
5. De vários lados se reconhece que, hoje, é necessário um novo modelo de desenvolvimento e também uma nova visão da economia. Quer um desenvolvimento integral, solidário e sustentável, quer o bem comum exigem uma justa escala de bens-valores, que é possível estruturar tendo Deus como referência suprema. Não basta ter à nossa disposição muitos meios e muitas oportunidades de escolha, mesmo apreciáveis; é que tanto os inúmeros bens em função do desenvolvimento como as oportunidades de escolha devem ser empregues de acordo com a perspectiva duma vida boa, duma conduta recta, que reconheça o primado da dimensão espiritual e o apelo à realização do bem comum. Caso contrário, perdem a sua justa valência, acabando por erguer novos ídolos.
Para sair da
crise financeira e económica actual, que provoca um aumento das desigualdades,
são necessárias pessoas, grupos, instituições que promovam a vida, favorecendo
a criatividade humana para fazer da própria crise uma ocasião de discernimento
e de um novo modelo económico. O modelo que prevaleceu nas últimas décadas
apostava na busca da maximização do lucro e do consumo, numa óptica
individualista e egoísta que pretendia avaliar as pessoas apenas pela sua
capacidade de dar resposta às exigências da competitividade. Olhando de outra
perspectiva, porém, o sucesso verdadeiro e duradouro pode ser obtido com a
dádiva de si mesmo, dos seus dotes intelectuais, da própria capacidade de
iniciativa, já que o desenvolvimento económico suportável, isto é,
autenticamente humano tem necessidade do princípio da gratuidade como expressão
de fraternidade e da lógica do dom. Concretamente na actividade económica, o
obreiro da paz aparece como aquele que cria relações de lealdade e
reciprocidade com os colaboradores e os colegas, com os clientes e os usuários.
Ele exerce a actividade económica para o bem comum, vive o seu compromisso como
algo que ultrapassa o interesse próprio, beneficiando as gerações presentes e
futuras. Deste modo sente-se a trabalhar não só para si mesmo, mas também para
dar aos outros um futuro e um trabalho dignos.
No âmbito
econômico, são necessárias – especialmente por parte dos Estados – políticas de
desenvolvimento industrial e agrícola que tenham a peito o progresso social e a
universalização de um Estado de direito e democrático. Fundamental e
imprescindível é também a estruturação ética dos mercados monetário, financeiro
e comercial; devem ser estabilizados e melhor coordenados e controlados, de
modo que não causem dano aos mais pobres. A solicitude dos diversos obreiros da
paz deve ainda concentrar-se – com mais determinação do que tem sido feito até
agora – na consideração da crise alimentar, muito mais grave do que a
financeira. O tema da segurança das provisões alimentares voltou a ser central
na agenda política internacional, por causa de crises relacionadas, para além
do mais, com as bruscas oscilações do preço das matérias--primas agrícolas, com
comportamentos irresponsáveis por parte de certos agentes económicos e com um
controle insuficiente por parte dos Governos e da comunidade internacional.
Para enfrentar semelhante crise, os obreiros da paz são chamados a trabalhar
juntos em espírito de solidariedade, desde o nível local até ao internacional,
com o objectivo de colocar os agricultores, especialmente nas pequenas
realidades rurais, em condições de poderem realizar a sua actividade de modo
digno e sustentável dos pontos de vista social, ambiental e económico.
Educação
para uma cultura da paz:o papel da família e das instituições
6. Desejo veementemente reafirmar que os diversos obreiros da paz são chamados a cultivar a paixão pelo bem comum da família e pela justiça social, bem como o empenho por uma válida educação social.
6. Desejo veementemente reafirmar que os diversos obreiros da paz são chamados a cultivar a paixão pelo bem comum da família e pela justiça social, bem como o empenho por uma válida educação social.
Ninguém pode
ignorar ou subestimar o papel decisivo da família, célula básica da sociedade,
dos pontos de vista demográfico, ético, pedagógico, económico e político. Ela
possui uma vocação natural para promover a vida: acompanha as pessoas no seu
crescimento e estimula-as a enriquecerem-se entre si através do cuidado
recíproco. De modo especial, a família cristã guarda em si o primordial
projecto da educação das pessoas segundo a medida do amor divino. A família é
um dos sujeitos sociais indispensáveis para a realização duma cultura da paz. É
preciso tutelar o direito dos pais e o seu papel primário na educação dos
filhos, nomeadamente nos âmbitos moral e religioso. Na família, nascem e
crescem os obreiros da paz, os futuros promotores duma cultura da vida e do
amor.
Nesta tarefa
imensa de educar para a paz, estão envolvidas de modo particular as comunidades
dos crentes. A Igreja toma parte nesta grande responsabilidade através da nova
evangelização, que tem como pontos de apoio a conversão à verdade e ao amor de
Cristo e, consequentemente, o renascimento espiritual e moral das pessoas e das
sociedades. O encontro com Jesus Cristo plasma os obreiros da paz, comprometendo-os
na comunhão e na superação da injustiça.
Uma missão
especial em prol da paz é desempenhada pelas instituições culturais,
escolásticas e universitárias. Delas se requer uma notável contribuição não só
para a formação de novas gerações de líderes, mas também para a renovação das
instituições públicas, nacionais e internacionais. Podem também contribuir para
uma reflexão científica que radique as actividades económicas e financeiras
numa sólida base antropológica e ética. O mundo actual, particularmente o mundo
da política, necessita do apoio dum novo pensamento, duma nova síntese
cultural, para superar tecnicismos e harmonizar as várias tendências políticas
em ordem ao bem comum. Este, visto como conjunto de relações interpessoais e
instituições positivas ao serviço do crescimento integral dos indivíduos e dos
grupos, está na base de toda a verdadeira educação para a paz.
Uma
pedagogia do obreiro da paz
7. Concluindo, há necessidade de propor e promover uma pedagogia da paz. Esta requer uma vida interior rica, referências morais claras e válidas, atitudes e estilos de vida adequados. Com efeito, as obras de paz concorrem para realizar o bem comum e criam o interesse pela paz, educando para ela. Pensamentos, palavras e gestos de paz criam uma mentalidade e uma cultura da paz, uma atmosfera de respeito, honestidade e cordialidade. Por isso, é necessário ensinar os homens a amarem-se e educarem-se para a paz, a viverem mais de benevolência que de mera tolerância. Incentivo fundamental será « dizer não à vingança, reconhecer os próprios erros, aceitar as desculpas sem as buscar e, finalmente, perdoar »,7 de modo que os erros e as ofensas possam ser verdadeiramente reconhecidos a fim de caminhar juntos para a reconciliação. Isto requer a difusão duma pedagogia do perdão. Na realidade, o mal vence-se com o bem, e a justiça deve ser procurada imitando a Deus Pai que ama todos os seus filhos (cf. Mt 5, 21-48). É um trabalho lento, porque supõe uma evolução espiritual, uma educação para os valores mais altos, uma visão nova da história humana. É preciso renunciar à paz falsa, que prometem os ídolos deste mundo, e aos perigos que a acompanham; refiro-me à paz que torna as consciências cada vez mais insensíveis, que leva a fechar-se em si mesmo, a uma existência atrofiada vivida na indiferença. Ao contrário, a pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança.
7. Concluindo, há necessidade de propor e promover uma pedagogia da paz. Esta requer uma vida interior rica, referências morais claras e válidas, atitudes e estilos de vida adequados. Com efeito, as obras de paz concorrem para realizar o bem comum e criam o interesse pela paz, educando para ela. Pensamentos, palavras e gestos de paz criam uma mentalidade e uma cultura da paz, uma atmosfera de respeito, honestidade e cordialidade. Por isso, é necessário ensinar os homens a amarem-se e educarem-se para a paz, a viverem mais de benevolência que de mera tolerância. Incentivo fundamental será « dizer não à vingança, reconhecer os próprios erros, aceitar as desculpas sem as buscar e, finalmente, perdoar »,7 de modo que os erros e as ofensas possam ser verdadeiramente reconhecidos a fim de caminhar juntos para a reconciliação. Isto requer a difusão duma pedagogia do perdão. Na realidade, o mal vence-se com o bem, e a justiça deve ser procurada imitando a Deus Pai que ama todos os seus filhos (cf. Mt 5, 21-48). É um trabalho lento, porque supõe uma evolução espiritual, uma educação para os valores mais altos, uma visão nova da história humana. É preciso renunciar à paz falsa, que prometem os ídolos deste mundo, e aos perigos que a acompanham; refiro-me à paz que torna as consciências cada vez mais insensíveis, que leva a fechar-se em si mesmo, a uma existência atrofiada vivida na indiferença. Ao contrário, a pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança.
Jesus encarna o
conjunto destas atitudes na sua vida até ao dom total de Si mesmo, até «perder
a vida» (cf. Mt 10, 39; Lc 17, 33; Jo 12, 25). E promete aos seus discípulos
que chegarão, mais cedo ou mais tarde, a fazer a descoberta extraordinária de
que falamos no início: no mundo, está presente Deus, o Deus de Jesus Cristo,
plenamente solidário com os homens. Neste contexto, apraz-me lembrar a oração
com que se pede a Deus para fazer de nós instrumentos da sua paz, a fim de
levar o seu amor onde há ódio, o seu perdão onde há ofensa, a verdadeira fé
onde há dúvida. Por nossa vez pedimos a Deus, juntamente com o Beato João
XXIII, que ilumine os responsáveis dos povos para que, junto com a solicitude
pelo justo bem-estar dos próprios concidadãos, garantam e defendam o dom
precioso da paz; inflame a vontade de todos para superarem as barreiras que
dividem, reforçarem os vínculos da caridade mútua, compreenderem os outros e
perdoarem aos que lhes tiverem feito injúrias, de tal modo que, em virtude da
sua acção, todos os povos da terra se tornem irmãos e floresça neles e reine
para sempre a tão suspirada paz.
Com esta
invocação, faço votos de que todos possam ser autênticos obreiros e
construtores da paz, para que a cidade do homem cresça em concórdia fraterna,
na prosperidade e na paz.
Vaticano, 8 de
Dezembro de 2012.
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