As
notícias sobre fatos de corrupção e desonestidade na administração do dinheiro
e do patrimônio públicos só não assustam ainda mais, porque já nos acostumamos
a elas, de tanto que aparecem na imprensa! Há alguns anos, talvez em 2005, numa
coletiva de imprensa, o presidente da CNBB da época disse que um dos maiores
males do Brasil é a corrupção; recebeu protestos e reprovação na opinião
pública. Parece, entretanto, que os anos sucessivos só confirmaram esse
alerta... Como enfrentar o mal da corrupção?
A
desonestidade e corrupção na administração do bem público têm consequências
duplamente funestas: de um lado, fatos muito graves são denunciados e requerem
séria investigação e uma justificação perante a sociedade; isso nem sempre
acontece e fica a sensação de impotência e resignação, como se nada pudesse ser
feito para impedir e mudar esse mal. Depois de cada escândalo, espera-se a
divulgação de mais algum...
Por outro lado, os fatos de desonestidade repercutem de maneira negativa na
educação das consciências; a própria capacidade de discernir e reagir fica
comprometida. Passa-se a impressão de que nada é esclarecido ou comprovado, ou
que tudo não vai além da luta pelo poder; que tudo é lícito a quem tem poder,
bastando defender-se, para se sair bem e, no final das investigações, escapar à
justiça e ao rigor da lei.
Existem
caminhos para mudar isso e para se ter uma convivência mais respeitosa, onde os
fatos de desonestidade sejam reprovados, sem jeitinhos e meias verdades? É
sabido o dito popular: “o exemplo vem de cima”. O comportamento de quem está
mais em evidência e ocupa postos de maior responsabilidade pública tem
influência sobre os outros. O bom e o mau exemplo marcam o senso ético.
Se
o exemplo “de cima” não é bom, as pessoas ficam autorizadas a seguir os maus
exemplos? Certamente não. O bem e a virtude são louváveis por si; o mal e os
maus exemplos são reprováveis por si sós e também e pelos seus efeitos. O bem
edifica e o mal destrói. Nada justifica imitar os maus exemplos. Mas é sempre
louvável seguir os bons exemplos. Por isso, quem está mais em evidência tem,
mais ainda, o dever de oferecer um exemplo de vida edificante aos outros.
Por
onde atacar a “cultura da corrupção”? De muitos modos e em muitas frentes.
Começa com a séria investigação das denúncias de desonestidade no cumprimento
dos deveres públicos, para averiguar a verdade, sem deixar dúvidas no ar, nem
cometer injustiça contra inocentes. A clara reprovação pública dos crimes de
desonestidade é o passo seguinte: deve ficar claro que não se compactua com a
desonestidade. E, se ficar comprovada a lesão do patrimônio público, por
desonestidade, deve haver ressarcimento justo do dano, para não ficar a
sensação de impunidade, ou que o crime compensa; em ambas essas hipóteses,
teríamos um incentivo ao crime.
A
desonestidade é um comportamento viciado, que se aprende e consolida, como um
modo de viver. A honestidade, a retidão e o senso de justiça são virtudes, que
também se aprendem e precisam ser incentivadas e educadas. O vício não é bom,
não faz bem e marca o caráter de forma negativa. A virtude é boa, merece apreço
e marca o caráter de forma positiva. A educação para as virtudes da honestidade
e da retidão precisa começar cedo; desde a mais tenra infância, a criança deve
aprender que algumas coisas lhe pertencem e, outras, não; que não deve
apropriar-se daquilo que é dos outros.
A
educação, de muitos modos, é fundamental para assegurar uma conduta honesta;
deve-se ter em vista, antes de tudo, a formação do caráter, para que seja forte
e se oriente por princípios éticos e morais sólidos. Os dez mandamentos da Lei
de Deus apontam os caminhos da retidão e da justiça. A vida oferece muitas
tentações. Sem um caráter bem formado, e sem princípios morais firmes, fica
difícil resistir à tentação do agir desonesto e à lisonja dos vícios.
Acima
de tudo, nunca devemos esquecer que se pode burlar a lei e escapar à justiça
dos homens. Mas, todos devemos prestar contas a Deus sobre nossa vida e o nosso
agir. Nem o fato de dizer que não se crê em Deus isenta disso. E, diante de
Deus, não há como burlar a lei, nem enganar o juiz.
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo