Ao
saberem da notícia da canonização do Padre José de Anchieta, muitas pessoas
perguntarem logo: qual foi o milagre? Por qual milagre ele se tornou santo?
As
perguntas não surgem sem motivo, pois a Igreja sempre tem falado que, para a
beatificação, é preciso que haja um milagre, acontecido pela intercessão
daquele que é beatificado; e, para a canonização, espera-se um novo milagre do
bem-aventurado. Desta maneira, a Igreja entende que Deus, o único a realizar
milagres, confirma a santidade daqueles que veneramos como “santo”.
A
Igreja é muito criteriosa e até severa para dar reconhecimento a um suposto
milagre. No caso de Anchieta, houve a confirmação de um milagre antes de sua
beatificação. Para a sua proclamação como “santo”, foi dispensada a confirmação
de um novo milagre. O Papa pode fazer isso, usando da autoridade que lhe é
própria. É verdade que não faltaram testemunhos sobre sinais prodigiosos conseguidos
através da intercessão de Anchieta; mas, de modo geral, tais supostos milagres
são de difícil verificação, dada a escassez de documentação e de testemunhos.
Aqui
se faz oportuna uma reflexão: os santos, assim reconhecidos e proclamados pela
Igreja, não se tornam “santos” por causa de algum milagre; o
reconhecimento público e oficial da Igreja supõe, acima de tudo, a vida santa
de quem é proclamado “santo”. Por isso mesmo, este ato oficial da Igreja não é
dito “santificação”, mas “canonização”, ou seja, inscrição na lista (“cânon”)
dos santos reconhecidos pela Igreja. Ninguém se torna “santo” depois da morte;
o que conta, é a vida santa e o testemunho de santidade durante esta vida.
Foi
o que aconteceu com Anchieta. O papa Francisco reconheceu oficialmente aquilo
que se tinha por certo já quando Anchieta faleceu, em 1597: foi um homem santo,
um homem de Deus, que se dedicou profundamente à obra do Evangelho, no
seguimento de Jesus; homem de extraordinária fé, esperança e caridade, ele
viveu conforme as bem-aventuranças, cultivou a misericórdia, a oração e a
comunhão com Deus; foi zeloso da glória de Deus e do bem do próximo, gastou sua
vida como missionário; foi um grande cristão, um sacerdote dedicado, um filho
amoroso da Igreja. E isso foi testemunhado pelos que o conheceram em vida e,
sem interrupção, confirmado pela Igreja, depois de sua morte, até nossos dias.
Falta alguma coisa para ser santo?!
As
pessoas gostam de saber: para qual “graça” o Santo deve ser invocado? A Igreja
ensina que, acima de tudo, os santos devem ser imitados; eles são testemunhas
de vida cristã, excelsos discípulos de Jesus. Em nossos dias, devemos pedir a
intercessão de São José de Anchieta para conseguir aquelas “graças” que mais o
caracterizaram em vida: ser pessoas de fé viva, apaixonados por Deus, pela
Igreja e sua missão; ser missionários dedicados e capazes até de sacrifícios
pela causa do Evangelho; ser catequistas criativos e interessados em comunicar
aos outros os tesouros do Reino de Deus; ajudar outros a se aproximarem de
Cristo vivo, a chegarem à alegria de crer; ser respeitosos para com todos,
promotores da justiça e da defesa dos mais fracos e vulneráveis; ser
pacificadores, sem deixar que a violência imponha a sua lei...
Quantos
“milagres” podemos pedir a Deus pela interessão de São José de Anchieta! Sem
esquecer que ele veio ao Brasil ainda jovem, com 19 anos de idade, com um
desejo imenso de “levar irmãos para Cristo” e de promover em tudo a maior
glória de Deus (“ad maiorem Dei gloriam”)... Nenhum sacrifício ou renúncia lhe pareceram demasiados para fazer
isso. Ainda hoje, Anchieta pode ser uma inspiração para muitos jovens!
Nosso
tempo desafia-nos a sermos missionários e isso requer “conversão pessoal e
pastoral”. O papa Francisco tem dito que precisamos ser um “povo em missão” e
uma Igreja “em saída”, indo aos irmãos que vivem nas “periferias” de
todos os tipos. Este é mais um “milagre” importante a ser pedido através do
missionário Anchieta, que largou tudo e foi ao encontro daqueles que viviam nas
periferias do mundo, na América...
Oh,
sim, valei-nos, São José de Anchieta! Olhai para o nosso Brasil, o “vosso”
Brasil! Pedi essas graças para nós! Precisamos muito desses milagres!
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo