Mais de uma vez, o Papa
Francisco tem apelado às consciências e aos senhores das guerras feitas com
supostas motivações religiosas: “não se pode justificar a guerra e a violência
apelando para o nome de Deus!”. O conceito de “guerra santa” é preocupante e é
repugnante a violência feita contra o próximo com justificação religiosa.
Acontece em nossos dias em várias partes do mundo. Cristãos são os mais
atingidos.
Existe uma guerra “santa”? A
resposta é um decidido não! É absolutamente descabido aplicar à guerra o
conceito de “santa”, que tem a ver com “sagrado”. E, fazer guerra “em nome de
Deus”, parte de uma compreensão inadequada de Deus e da religião. A violência
contra o próximo não presta glória a Deus, nem honra seu nome.
A religião pode ser usada
como pretexto ideológico e político para alcançar objetivos nada religiosos,
como o poder, as vaidades, a dominação e o dinheiro. Nesse caso, da mesma
forma, ela é usada e manipulada indevidamente e desviada de sua verdadeira
finalidade, que é a glória de Deus e a “salvação” do homem.
Não é raro que, atrás de
tensões e manifestações de violência, ou até de guerras, haja motivos
religiosos. Foi o caso da longa guerrilha dos católicos na Irlanda do Norte.
Geralmente, porém, não é por questões de fé religiosa que se combate, mas por
haver profundas injustiças e discriminação religiosa, às quais os cidadãos
oprimidos reagem, para a sua superação. Quando algum grupo de “crentes” é
vítima de discriminação e opressão, estão em jogo direitos humanos e direitos
civis.
Nesse caso, requer-se a
superação das injustiças e da negação de legítimos direitos humanos.
Justifica-se, então, a guerra? A resposta é: não se corrigem violências com
mais violências. O que se requer, é toda forma de diálogo construtivo para
“desarmar” os opressores e a pressão política local e internacional, para
chegar a uma convivência respeitosa dos direitos humanos fundamentais e dos
direitos civis.
Estamos assistindo,
infelizmente, a formas brutais de negação da liberdade religiosa e de imposição
da vontade de “poder religioso”, com a negação radical do direito à liberdade
religiosa, até mesmo mediante a tortura e o martírio. Por outro lado, as
notícias falam da imposição da religião à força. Acontece em nossos dias em
vários lugares do Oriente Médio e do mundo. Muitos protestos e desaprovações a
essas violências também estão aparecendo.
Em São Paulo, será feita uma
manifestação conjunta de cristãos, judeus e muçulmanos, que convivem e querem
continuar a conviver em paz nesta Metrópole. Será no dia 7 de setembro, às 16h,
na Catedral da Sé, escolhida de comum acordo entre representantes dos três
grupos para sediar o evento. “Em nome de Deus, juntos pela paz: cristãos,
judeus e muçulmanos” – este será o tema de fundo da manifestação
inter-religiosa, que será aberta a todos aqueles que quiserem participar.
Em nome de Deus, não a
guerra, mas a paz! Não podemos ficar resignados e passivos diante das várias
guerras fratricidas, que estão acontecendo no mundo. Mais ainda, quando
manipulam a religião, como “força de guerra”. Não é justo e é perigoso, além de
desmoralizar a religião. A violência, em nome da religião, é uma profunda
ofensa a Deus e ao próximo; ela deve ser “força de paz”, de reconciliação, de
fraternidade e de compaixão. Só esses sentimentos e atitudes podem legitimar o
recurso ao nome de Deus.
Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo